O Rato da Europa apresenta-se como uma colecção de textos inéditos que pretendem desenvolver, através dos mais variados géneros e feitios, uma reflexão alargada sobre o lugar de Portugal na Europa e a relação de Portugal com essa dita Europa. Se o primeiro problema que se coloca é o de tentar perceber se as duas coisas são ou não a mesma coisa, se este confronto é ou não uma antinomia, outras questões, que daqui decorrem, passarão forçosamente pela aferição das taxas de câmbio entre representações, pela afinação da balança comercial das identidades, pela identificação do que continua a ser contrabando, pela revisão das fronteiras de um horizonte europeu que se define por aquilo que propõe ou que se funda naquilo que interdita. É, pois, urgente saber se chamamos Europa a um acordo de boa vizinhança, que nos permite ir a Bruxelas pedir um raminho de salsa para a tortilha, se a Europa é um diálogo, uma abertura, uma construção colectiva, se é a Europa um projecto político comunitário ou um conjunto de normas sanitárias e de directrizes para a calibragem de maçãs, se a Europa das cruzadas é, hoje, pátria de cavaleiros que se batem pela democracia ou terra de vilões dispostos a tudo pilhar em nome da mesma democracia, se o velho continente se transformou ou não num shopping vigiado, onde os cidadãos se confundem com os consumidores, ou se Europa é, afinal, o nome do arame farpado que estendemos ao longo do Mediterrâneo.
Isto escrevi há pouco mais de dois anos quando lançámos Boomerang, de Pedro Eiras, livro que abriu O Rato da Europa e – assim acreditávamos – seria em breve sucedido por outros que completariam a colecção, multiplicando pontos de vista sobre os mesmos assuntos. Enganámo-nos: o parto da Ópera Europa foi sangrento e demorado. A Europa que aí se opera sofreu profundas transformações desde o momento em que a Regina Guimarães começou a tratar da sua concepção até ao dito parto, a ponto da Europa onde essa outra Europa se pariu ser hoje uma ideia em crise. Esgotou-se a salsa, zangaram-se as comadres e acabaram-se as verdades. Não é que seja preciso ir tão longe para vender um projecto editorial, mas certo é que O Rato da Europa recobrou “actualidade” – o que vale hoje mais do que uma novena –, tanto que a Capital Europeia da Cultura resolveu (e bem, como lhe compete) apoiar a sua impressão.
António Preto
Doutorado em Estudos Cinematográficos.
Professor universitário.
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